sexta-feira, 2 de setembro de 2011

A Chave - o Tempo e o Talvez

Tenho me perguntado se a utopia da Sociedade do Bom Senso é possível além de plausível. É evidente que acredito que sim. Mas crer somente é muito pouco. Então a pergunta que me faço é "como seria possível"? E mais. Quais as condições para a transformação social? Qual é a chave da mudança?
No dia 1 de setembro de 2011 tive uma experiência única ao ouvir a palestra do Dr. Julio Decaro sobre "Novos Líderes para Novos Mundos" durante o evento de comemoração dos 10 anos da empresa INEX Marketing. E agradeço ao empresário Henri Krause e à sua equipe pelo convite e cumprimento pela excelência do evento realizado no Teatro do CIEE em Porto Alegre-RS naquela data.
Aqui ressalto três compreensões necessárias à humanidade:
  • Impermanência
  • Aleatoriedade
  • Conectividade
Ficou evidente que precisamos de lideranças com outra percepção da vida e da humanidade e, portanto, com um novo comportamento empático e ético. Que entenda a conectividade da existência com o Todo e ontologicamente se veja no Todo assim como o Todo está em cada um, inclusive em si mesmo. E que aceitemos a impermanência que é concepção de eternidade. O Todo se transforma, mas é Todo. Cada um se transforma, mas é cada um. E somos um no Todo. E o Todo nos inclui.
Os atos que praticamos tem consequências no futuro, independentemente da intensidade, do tempo e do local. E, segundo algumas teorias, o futuro também afeta o presente, na medida que o tempo é só mais uma dimensão da realidade. Nos transformamos como o Todo se transforma. É a impermanência. Os budistas tem esta clara compreensão há milênios.
E some a compreensão de como os eventos aleatórios afetam a nossa vida. Veja o conto taoista entitulado "Talvez" (obtido em Contos Zen):
Há um conto Taoísta sobre um velho fazendeiro que trabalhou em seu campo por muitos anos. Um dia seu cavalo fugiu. Ao saber da notícia, seus vizinhos vieram visitá-lo.
"Que má sorte!" eles disseram solidariamente.
"Talvez," o fazendeiro calmamente replicou. Na manhã seguinte o cavalo retornou, trazendo com ele três outros cavalos selvagens. "Que maravilhoso!" os vizinhos exclamaram.
"Talvez," replicou o velho homem. No dia seguinte, seu filho tentou domar um dos cavalos, foi derrubado e quebrou a perna. Os vizinhos novamente vieram para oferecer sua simpatia pela má fortuna.
"Que pena",disseram.
"Talvez," respondeu o fazendeiro. No próximo dia, oficiais militares vieram à vila para convocar todos os jovens ao serviço obrigatório no exército, que iria entrar em guerra. Vendo que o filho do velho homem estava com a perna quebrada, eles o dispensaram. Os vizinhos congratularam o fazendeiro pela forma com que as coisas tinham se virado a seu favor.
O velho olhou-os, e com um leve sorriso disse suavemente:
"Talvez."

"Talvez" é a compreensão do aleatório. Um evento acontece quando um conjunto de fatores se unem especificamente favorecendo a ocorrência num dado momento. Por que um acidente ocorre? Por que alguem nasce com alguma deficiência ou necessidade especial? Por que ganha-se na loteria? Por que seu time é campeão? Por que acertei o alvo? Por que alcançamos a meta? Por que que chegamos atrasado ao encontro? Por que o pneu furou? Por que adoecemos? Por que nascemos? Por que morremos? É simples, por que o talvez se realiza eventualmente. O livro do físico Leonard Mlodinov entitulado "O Andar do Bêbado" esclarece objetivamente esta compreensão do aleatório. E se aceitamos a impermanência e o aleatório, falta compreender a conectividade.
Qual a causa de uma cadeira ou de uma folha de papel (exemplos retirados da palestra do Dr. Decaro)? Quando vemos as coisas de modo superficial não percebemos as conexões intrincadas e amplas da existência. O papel veio de uma fábrica com pessoas, de uma árvore, que precisa de terra, de sol e chuva, e as pessoas precisam de alimentos feitos de terra, sol e chuva e nós que viemos de nossos pais e nossos pais de nossos avós... e assim por diante. A cadeira teria um raciocínio semelhante. Se pensarmos em roupa, carro, brinquedo, lápis, computador, caneca, panela, garfo, faca, arma, presídio, trator, gado, leite, detergente, a gente, enfim qualquer coisa, animal ou pessoa, teremos um raciocínio semelhante. Então se passarmos a ver a humanidade e a natureza expressas numa folha de papel em branco, passamos a perceber, pensar e sentir empaticamente a conectividade de tudo no Todo. Surge a noção da responsabilidade.
Então, o Dr. Decaro em sua palestra nos mostra fotos dele mesmo atuais e mais jovens e diz para cada imagem: "Este sou eu... não é igual a mim... mas também não é totalmente diferente". E mostra fotos de seus pais, avós, filho e netos e repete: "Este sou eu... não é igual a mim... mas também não é totalmente diferente". E o raciocínio se expande para toda a humanidade e para toda a natureza e para todo o universo. Vertical e horizontalmente. Seja o universo Quântico ou Newtoniano, não importa.
A Conectividade se opõe ao isolamento. "Como se sabe qual abelha fez o mel" (mais uma questão proposta pelo Dr. Recaro)? A percepção da conectividade nos dá a clareza de nossa responsabilidade. É o "efeito borboleta" . Mas responsabilidade antes de tudo. Por que toda ação tem consequências no Todo na transformação e na aleatoriedade pela conectividade. E eu sou no Todo e o todo está em mim. Sou, portanto, responsável egoísticamente pelo Todo.
O líder que perceber com a razão e o coração que tudo se tranforma, que a aleatoriedade existe e que tudo e todos estão intrincadamente conectados, toma ações de responsabilidade universal. E ações benéficas pois elas vão ter consequências diretas sobre si mesmo, portanto egoístas.
O ser humano cria fronteiras, credos, etnias, orientações sexuais, classes sociais ou qualquer outra segmentação para diferenciar, segregar, beneficiar ou engendrar razões fortalecidas por interesses momentâneos. No entanto estas diferenças, de fato não existem, mas podem influenciar nossas ações. As consequências de nossas ações existem. E as ações são frutos de nossas verdadeiras intenções ou de nossa ignorância.  O fato é que tudo que fazemos afeta o Todo e, portanto, a nós mesmos. E nos transformamos conectados continuamente em alguma direção. Talvez para melhor. Talvez...
Na noite daquela palestra maravilhosa do Dr. Decaro eu vinha de carro com minha esposa e, dada a escuridão, fui surpreendido por um buraco no pavimento da Rua Cairu na cidade de Canoas-RS. Os dois pneus direitos de meu carro estouraram com amassamento de rodas e era quase meia-noite. Neste momento o local não indica muita segurança para trafegar a pé. Porém estava influenciado pelas palavras do Dr. Decaro. E não senti raiva, nem tristeza, nem insegurança. Apenas aceitei a aleatoriedade do fato. Percebi que o máximo que poderia acontecer é que eu tivesse que comprar dois pneus novos. Assim, mantive o carro em funcionamento e me dirigi a garagem de casa sem parar para trocar os pneus, afinal tinha apenas um estepe. Dormimos e no outro dia antes do trabalho, dirigindo também, fui até um borracheiro. Ele consertou os pneus e as rodas e não houve necessidade de gastar com pneus novos, o que seria esperado. Mas ele me informou que no pneu dianteiro havia um prego. Então eu pensei no que poderia ter acontecido se não tivesse caído no buraco. E no final de semana com a esposa e filhas fossemos viajar com o pneu furado sem perceber? O que poderia ter acontecido? Talvez sim... talvez não. Talvez... O que importa é como encaramos os fatos da vida. É a compreensão do significado de felicidade. Uma experiência única. Uma nova percepção. Um novo contexto. Uma nova perspectiva. Uma grande possibilidade. Uma realidade nova.
A Sociedade do Bom Senso, onde a humanidade seja respeitada e feliz, onde o cumprimento de deveres humanos se traduzem em direitos humanos auferidos é a expressão de uma nova realidade. Muito diferente da que vivemos. E ela se tornará realidade por uma única razão. Por ser possível. Pode ser um evento aleatório, um talvez. Mas quando todos os fatores propícios para esta ocorrência se encontrarem no tempo, eis a realidade. Esta realidade começa com uma idéia. Uma idéia revolucionária até para o que conhecemos como revolução. Por que se faz sem armas, sem guerra, sem violência. Mas se faz com humanidade, serenidade, paciência, meditação, paz e silêncio. Eu imaginava que não estaria aqui para ver esta nova realidade, mas me enganei. Alguém estará vivendo para ver os novos líderes, a nova sociedade e o novo mundo. E este alguém "será eu... não será igual a mim... mas também não será totalmente diferente".
Simples assim, mas pleno de bom senso.

3 comentários:

  1. John Soprana! Que ótimo texto o que escreveste, agradeço a conjuntura de eventos e "talvezes" que combinados me trouxeram até o seu Blog. Estava procurando outras coisa e seu texto me chamou muito a atenção. Espero poder trocar mais ideias, sobre o universo, liderança e conceitos da física quântica! Abraços! Henrique Ribeiro.

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    1. Muito obrigado Henrique Ribeiro... e que possamos continuar sempre trocando ideias para nosso crescimento.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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