quarta-feira, 15 de junho de 2011

Direito a Uma Ordem

Se desejamos uma sociedade onde os direitos humanos possam ser plenamente providos mediante o cumprimento de deveres humanos, é lógico que devamos ter uma ordem social e internacional que permita tal ideal.
Pois, o vigésimo oitavo artigo da DHDU estabelece que "toda pessoa tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e  liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados".
Onde há algum lugar no mundo que se encontre tal ordem? Eu não conheço. O Brasil? Este país tem todo o potencial para propor uma ordem viável que vá ao encontro deste anseio. Mas estamos anos-luz de distância desta realidade por que simplesmente não interessa a quem se locupleta dos benefícios oriundos da ordem social, política e econômica instalada. E aos excluídos desta locupletação temos como oferecer benefícios assistencialistas que tornam a população eternamente grata por terem feito muito menos do que deveriam. E a vida segue enquanto houver futebol e bolsa "favela" que alguns chamam propagandisticamente de bolsa "família".
A ordem social brasileira é "tranquila", sem hospitais, sem médicos, sem aposentadoria, sem escolas, sem saneamento básico, sem infra-estrutura de transporte e energia, com greves no serviço público, com violência, com tráfico de drogas, com cracolândia, com pessoas em subempregos em esquinas, com flanelinhas, com bicheiros, com jogos proibidos em butecos, com roubo de sinal digital de tv por assinatura, com favorecimentos em licitações, sem segurança, enfim sem nada que preste. (perdoem a mistura de ironias com realidades... mas é irresistível).
Pergunto neste exato momento se tem alguem no congresso resolvendo eficazmente um dos problemas acima? Resolvendo de modo que nunca mais voltem a ocorrer. Mas um só. De fato é muito difícil isto acontecer, afinal temos apenas um Congresso Nacional que é composto por 81 senadores e por 513 deputados federais, sem considerar a "patota" que vai de arrasto com esse pessoal, constatamos que é "muito pouco pessoal" pra resolver definitivamente pelo menos um problema crucial do país. Temos o orgulho de fazer pequenas questões cuja resposta seja sim ou não par auxiliar esta reflexão:
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para prover educação escolar, profissional e universitária para todos no país?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para a violência no país?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para eliminar o caixa dois de contabilidades de campanhas políticas?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para a eliminar a indigência nas grandes cidades?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para acabar com as invasões e ocupações ilegais de terra no país?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para que todos tenham acesso a serviços de saúde de qualquer natureza, para qualquer idade e em qualquer canto do país?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para as acabar com o consumo de drogas no pais?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para que todos possamos sair de casa e exercer o direito de ir e vir com segurança em qualquer ponto da nação e em qualquer horário?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para acabar coom os matadores de aluguel, pelo menos no centro-oeste e norte do país?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para que todos tenhamos saneamento básico e esgoto tratado em todos os municípios do país?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para que o código do consumidor seja obedecido de tal sorte que não precise ações frequentes e demoradas na justiça?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para aprovar a pena de morte para deputados e senadores corruptos?
  • O Congresso Nacional produziu alguma solução definitiva para algo que preste nos últimos 30 anos?
Acho que poderia ficar dias fazendo perguntas deste tipo. Deixo a você leitor que responda intimamente e tire suas conclusões. De minha parte entendo que temos duas opções: ou aumentar o tamanho do congresso para que tenhamos um conjunto de pessoas suficiente pra fazer o trabalho necessário que não é feito hoje ou que saibamos eleger quem seja capaz de fazer o que é necessário.
Eu apenas afirmo que "nosso povo está muito bem representado", pois o congresso é o espelho amostral do nosso povo. Se nossos representantes são incompetentes, é por que somos um povo incompetente. Se temos representantes notoriamente ou supostamente desonestos, é por que a honestidade não é um valor para a maioria de nosso povo. Se nossos representantes não trabalham como deveriam (o velho Waldemar me disse, quando eu ainda era menino, que quando alguém não trabalha com afinco naquilo que prometeu fazer, podes considerá-lo  "vagabundo", e quem promete e não cumpre é "caloteiro") é por que nosso povo também não se importa que o seu trabalho seja competente ou não.
Ou seja, parabéns querido povo brasileiro. Conquistamos a democracia. E com ela colocamos representantes iguaizinhos a nós mesmos. Nada pode ser melhor, não é?
Suponha agora que alguém simplesmente diga que ao Congresso compete o poder legislativo, ou seja, fazer as leis. Cabe ao Executivo, com o perdão do pleonasmo, executá-las. Perfeito. Façam as mesmas perguntas substituindo-se "Congresso Nacional" por "Presidente da República" (e na penúltima questão troque "deputados e senadores" por "presidente e ministros"). Será que as respostas seriam as mesmas? Se os resultados na sociedade são os mesmos,  a resposta é a mesma. E a conclusão também.
A presidência é um cargo eletivo pelo voto direto. Portanto ele (ou ela) representam o povo e seus desejos. Logo, estamos muito bem representados. Nesse momento que escrevo, faz pouco tempo que o MInistro Chefe da Casa Civil teve que ser substituído por ter que responder acusações de supostas ilegalidades ou imoralidades sem provas. Eu fico imensamente compadecido com tamanha injustiça. Como pode o presidente destituir um chefe da casa civil, seu "braço direito", por uma acusação infundada e destituída de qualquer princípio de realidade ou indício de ilegalidade. É melhor ainda ouvir as declarações de que o "Sr. Ministro teve que se afastar para poder se defender com tranquilidade". Mas se defender do que? De nada? E olha que esta última foi somente a terceira vez que um Ministro Chefe da Casa Civil teve que sair para se defender de acusações supostamente sem provas de ilegalidade.
Parabéns querido povo brasileiro. O Poder Executivo é a perfeita expressão de nós mesmos. Isto mesmo. Inclusive de quem não votou nos atuais governantes. É a regra democrática.
Agora as pergunta fatais:
  • Nossa atual ordem social-política-econômica permite que possamos receber todos os direitos humanos descritos na DUDH? 
  • As pessoas do Legislativo e do Executivo, em quem votamos livre e conscientemente, vão resolver definitivamente pelo menos um problema fundamental da sociedade brasileira?
  • Estas mesmas pessoas vão assegurar que todos os direitos humanos sejam auferidos a cada cidadão brasileiro até o final deste ano? Entendo que seis meses é um tempo justo e mais que suficiente para esperarmos por um DIREITO!
Concluindo, se uma nova constituição não for construída com base no texto da DUDH, os direitos humanos jamais serão assegurados ao verdadeiro cidadão. O Brasil precisa de uma nova ordem social, política, econômica, ética, moral e efetiva em preservar a humanidade dos cidadãos. Sinto muito, mas a constituição de 1988 foi um estelionato ao sonho de muitos brasileiros e uma oportunidade para um conjunto de aproveitadores. Respeito o falecido Ulisses Guimarães, mas não compartilho em chamar nossa atual constiuição de "cidadã", pois é um texto que me envergonha e sua aplicação prática é incapaz de preservar a humanidade do verdadeiro cidadão.
Precisamos uma nova constituição para termos uma ordem no Brasil e no mundo também. Simples assim mas pleno de bom senso.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Cultura, Arte e Ciência

O artigo de número vinte e sete da DUDH é o ideal do ócio criativo, cujo texto, composto de dois tópicos, se desenrola a seguir:
"1. Toda pessoa tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do processo científico e de seus benefícios.
2. Toda pessoa tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica, literária ou artística da qual seja autor."
Basicamente este é o direito de participação do ser humano da produção cultural, da arte e da ciência e para isto não há como negar a necessidade de tempo para o ócio criativo. E, mediante tal produção criativa, deve-se assegurar a proteção moral e material desta produção, ou seja, a propriedade intelectual.
Sobre a necessidade de redução radical de horas de trabalho já fomos suficientemente enfáticos. Tal redução é necessária para permitir ao ser humano exercer a sua humanidade de forma criativa ou simplesmente não fazer nada, dado que é seu direito. 
Mas o maior problema da humanidade atual é que, apesar de todo avanço tecnológico, nada disto se traduziu em modelos de vida que permitam à pessoa usufruir de tempo para a criação cultural, artística e/ou científica. As pessoas que hoje têm condições de exercer o ócio criativo são aquelas que ao longo de sua vida conseguiram por sorte ou competência um sistema de negócio com fluxo de caixa positivo de tal modo que possam ter um tempo livre. Estas pessoas chamamos de "ricos". Uma pessoa que tenha dinheiro mediante fluxo de caixa positivo, mas que não tenha tempo livre ainda não é rico.
É preciso criarmos uma estrutura social e econômica totalmente nova a fim de democratizarmos o tempo livre. Desta forma democratizaríamos, no mínimo, a possibilidade de uma revolução criativa no mundo. Percebe-se logicamente a necessidade da drástica redução da carga horária de trabalho (considerando que trabalho é "tudo que faz suar e que não é esporte" na concepção de Domenico de Masi).
A partir disto, a proteção intelectual é uma forma de assegurar o benefício da criatividade para o ente criativo. O Brasil é, em si, muito carente e fraco na produção intelectual, principalmente científica, apesar de ter uma diversidade cultural e artística imensa com uma produção intensa. Mas nossos principais cientistas e artistas acabam tendo maior benefício de sua produção a partir de outros países que respeitam a propriedade intelectual do que no Brasil. É lamentável. 
O pior é a precariedade da produção científica, numero de patentes e os negócios advindos dessas. Há inúmero dados sobre o registros de patentes no país. Via de regra as patentes registradas no país por não residentes é maior do que as registradas pelos brasileiros. Na comparação com os países em desenvolvimento enquanto a China registra milhares de patentes por ano o Brasil registra algumas centenas tendo normalmente o pior desempenho entre o grupo do BRIC. Mais uma comparação: o Brasil inteiro em 2008 registrou 384 patentes, enquanto somente a empresa Apple lançou mais de 200 patentes em 2007 para a tecnologia do iphone. Precisa uma comparação mais triste? Nosso país inteiro tem uma produção equivalente (ou pouco maior) a de uma única empresa para um único produto.
Bem, talvez o número de patentes, por si, não represente a qualidade do que foi patenteado. Então quando analisamos o resultado financeiro em planos de negócio, crescimento da economia pela inovação, número de empregos gerados e impostos recolhidos em função de tais patentes chegamos a conclusão que somos imensamente incompetentes e é preciso recolher a vontade de chorar e olhar para o futuro buscando alguma solução.
A solução é o tempo livre para a felicidade das pessoas no exercício do ócio criativo junto com um quarto poder que assegure os benefícios da produção criativa para seu criador e sua família. Simples assim, mas pleno de bom senso.

Educação e Instrução - Direito de Aprender

Interessante perceber como está escrito o vigésimo sexto artigo da DUDH que trata do direito à instrução e como não usa a palavra "educação". Esta é uma distinção importante para o que nos promomos em termos de premissas para uma sociedade nova, com base no bom senso e no exercício pleno dos direitos humanos na medida que cumprimos os deveres humanos. Vejamos o texto do referido artigo que possui três tópicos:
"1. Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito.   
2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.   
3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos."
Primeiramente vamos propor uma distinção conceitual entre educação e instrução segundo o Novo Dicionário Eletrônico Aurélio versão 6.1.
  • Educação é um processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral, visando à sua melhor integração individual e social.
  • Instrução relaciona-se com conhecimentos adquiridos; cultura, saber, erudição.
Então a educação é um processo em que o ser humano se insere e ocorre ao longo de toda a sua vida. A instrução é apenas uma parte ou componente deste processo. O artigo da DUDH que estamos discutindo neste momento se concentra na instrução. E no conceito de instrução não se inclui, por exemplo, o aspecto moral, explícito no conceito de educação. 
Vamos, por enquanto, nos concentrar no direito a instrução, o qual está diretamente relacionado com o modelo escolar de cada país. Por absoluta ignorância em relação a outros modelos, vou discutir o modelo brasileiro.
Hoje, para uma vida numa base comum, pai e mãe devem trabalhar. Após o nascimento do filho e passado o período de licença maternidade, os pais devem ter um lugar para deixar seus filhos enquanto trabalham, em casa de parentes, em creches ou "escolinhas" ou sob os cuidados de uma pessoa de sua confiança. A atividade de instrução formal funtamental começa idealmente por volta dos 6 anos de idade e dura  9 anos. Depois inicia a fase do ensino médio com a duração de três anos. Há também escolas técnicas (ensino profissionalizante) de nível médio. Depois, inicia a luta para ingressar em uma universidade, faculdade ou institutos tecnológicos através de processos de seleção. Os mais difíceis, em geral, são para ingressos em universidades federais ou estaduais onde o ensino superior é "gratuito" (não é grátis, mas pago e financiado pelos impostos). Faculdades e universidades particulares possuem processos de seleção menos rigorosos em geral. Assim, por uma necessidade de mercado surgiram cursos de preparação para vestibulares, vulgarmente chamados de "cursinhos" ou "pré-vestibulares". 
Agora voltemos nossa atenção para o texto do primeiro tópico do artigo XXVI da DUDH. A instrução elementar e fundamental é obrigatória. O acesso aos cursos técnico-profissionais é um direito de todos, mas a universidade só por mérito. É exatamente assim que o nosso modelo de educação está planejado. E simplesmente não funciona.
Veja que é a primeira vez que me oponho a um texto da DUDH, pois a meritocracia de acesso à Universidade é preconceituosa, injusta e desumana, contrariando em gênero, número e grau a intenção primária desta declaração universal. Não é mérito, pois qualquer um merece um curso superior. Mas competência para exercer a profissão é outra coisa. O texto da DUDH foi concebido em 1948  por pessoas muito anteriores a era da informação e sequer concebiam um modelo de instrução e aprendizado que pudesse exceder os limites de uma escola ou universidade. A internet não fazia parte dos seus contextos e portanto não haveria como prever a dimensão de suas consequências. Há que se rever toda essa lógica e o papel do estado neste aspecto precisa ser totalmente revisto. 
O fato é que a qualidade da instrução no Brasil é, na média, muito ruim, quando comparada com países mais desenvolvidos. Eu pude constatar crianças pré-escolares assistindo aula sobre o Antigo Egito em pleno Museu do Louvre em Paris. Entendo que algumas condições não podem ser reproduzidas no Brasil, mas há que se encontrar meios alternativos. Daí a necessidade de criatividade e inovação por parte dos professores. E chamo de professores pois me oponho a oferecer uma responsabilidade maior do que seja adequada caso os consideremos "educadores". Também tenho verdadeira ojeriza ao termo "trabalhadores em educação" que nada mais é do que uma redundância que se propagou para diversas atividades. O termo "trabalhadores em" alguma coisa foi consagrado ideologicamente por parte de muitos líderes de sindicatos e políticos a fim de aproximar pessoas que exercessem qualquer atividade ao Partido dos Trabalhadores, vulgo PT e outros que buscaram o mesmo alinhamento.  Então prostitutas viraram trabalhadoras em serviços sexuais, flanelinhas são trabalhadores em estacionamentos públicos, bicheiros são trabalhadores em serviços de jogos populares, pichadores são trabalhadores em arte urbana, cambistas são trabalhadores em tiquetes de eventos, fora os trabalhadores de verdade. Uma prática de propaganda política inteligente, tenho que reconhecer, mas que não compartilho pela falta de explicitação clara da motivação real da alteração do nome, mas velada, subliminar e inescrupulosa. Eu simplesmente não consigo confiar em político que age de maneira subliminar, sem apresentar com clareza e firmeza suas idéias de forma que agradem ou desagradem a quem quer que seja, pois a sinceridade dos seus atos deveriam ser coerentes com o seu discurso. Hoje em dia, a América Latina passa por uma onda esquerdizante e bolivariana em discursos a fim de obter o poder. No entanto, após a aquisição deste, a prática governamental tem se destacado por dois tipos de iniciativa, ditatorial no sentido de reduzir a atuação da imprensa livre e aumentando a censura, ou práticas verdadeiramente neo-liberais reduzindo o poder do estado e aumentando a influência de interesses de grupos privados. Diz-se popularmente que no Brasil os governos atuais são como violinistas que seguram com a esquerda mas tocam com a direita. Basta ver o tempo inútil de discussão entre PT e PMDB na divisão do poder no Brasil de hoje. Enquanto isso o Brasil segue seu destino a deriva e sem uma visão de longo prazo (maior que 50 anos). O planejamento de um governo no Brasil é feito para no máximo três anos, visto que gasta quase um ano para fazer o planejamento depois da eleição, gastando o dinheiro público no que deveria ter feito antes da eleição. Nos últimos 20 anos nada se fez que melhorasse verdadeiramente a condição de instrução do povo brasileiro. Como posso afirmar isso, se muito dinheiro foi investido nessa área? Por que os problemas continuam os mesmos: qualificação, plano de carreira e salário deficiente de professores, condições inadequadas de ensino-aprendizagem, merenda escolar deteriorada, escolas com manutenção precária, violência, drogas, conteúdos insuficientes e desatualizados, livros didáticos errados e outros fatores desastrosos para a formação ética, moral e instrucional de nossos cidadãos. Ou seja, se houve dinheiro investido, este dinheiro verdadeiramente foi jogado fora.
Mas vamos focar na instrução. Todos temos acesso a informação e a instrução. Basta primeiramente querer aprender. Os pais podem escolher o gênero de instrução a ser dada a seus filhos, visto que esta vai influenciar seus valores éticos e morais. Mas não deveria ser dada a chance de escolher nenhum tipo de instrução. Então o Estado deve assegurar que todos tenham alguma instrução. E instrução de qualidade em todos os níveis. Nos ensinos fundamental e médio deveriam constar dois conteúdos básicos, além dos já consagrados:
  1. Legislação: não pode se formar um cidadão para cumprir a lei sem que este conheça profundamente a legislação. Alías no Brasil há uma lei para afirmar que o desconhecimento da lei não pode ser usado como justificativa para o não cumprimento desta. Pois que se promova obrigatoriamente o conhecimento da lei. No ensino médio, no mínimo, todo cidadão deveria ter o conhecimento de um bacharel em direito.
  2. Financeiro: não se pode formar um cidadão sem que este saiba como gerenciar de forma profícua suas finanças. Deve saber fazer cálculos, planos de negócio, dominar diversos tipos de investimento, métodos de aplicação em bolsa de valores e mercados futuros. 
Assim como já concluímos quando abordamos o artigo anterior, ao utilizarmos a expressão do velho Waldemar que "cachorro com dois donos morre de fome", a instrução no Brasil padece do mesmo mal. Temos escolas, institutos tecnológicos, faculdades e universidades municipais, estaduais, federais e particulares. E o sistema não funciona em todos os casos no país. O que fazer?
Temos que reconhecer que se gasta demais no processo e pouco no fim, que é o aluno. Via de regra, apesar de poucos casos públicos com relativo sucesso, as escolas particulares vem provendo uma instrução mais eficaz.
Só para que se entenda o que quero dizer, vamos usar o caso de um instituto tecnológico. O MIT-Massachusetts Institute of Technology nos Estados Unidos (visite http://mit.edu/ e tente não chorar de inveja), com sua produção tecnológica movimenta um mercado bilionário de investimentos em novos negócios e patentes, justificando cada centavo público aplicado e demostrando o retorno do investimento público em impostos pelas empresas dos alunos egressos. Pergunto, quantas patentes foram registradas por Institutos Tecnológicos no Brasil e quantas resultaram em alguma empresa lucrativa e, destas, quanto retornou de impostos como resultado do investimento público?
Você acha que a experiência do MIT é muito recente? Ele só tem 150 anos. De fato o Brasil não teve tempo hábil de aprender com esse tipo de experiência não é? É duro admitir a própria incompetência. Somos literalmente incompetentes em instrução ao nosso povo. Simples assim. E só quando admitirmos isso teremos alguma chance de fazer um planejamento de longo prazo para a nação e torná-lo uma realidade.
Uma outra questão deve ser considerada quando falamos de instrução. Há a liberdade individual. Quem aprende é o aprendiz - é no aluno que o aprendizado ocorre. Tudo que for externo ao aluno são estímulos, mas é no íntimo intrínseco ao aluno que se dá o aprendizado. Infelizmente a ignorância é uma escolha e a sociedade deve ter mecanismos de proteção à ignorância. Não há cidadania na ignorância. Portanto não pode haver direitos de cidadão para ignorantes. Pois, em síntese, quando temos meios viáveis de aprender disponiveis, a ignorância é uma escolha do indivíduo (há quem pense que não é uma escolha devido a condicionantes sócio-econômico-políticos, mas do ponto de vista prático não há como negar que em última instancia ainda é uma escolha pessoal). Se a vida lhe ensinar o peso nefasto da ignorância, em qualquer momento você pode mudar esta situação e recuperar sua dignidade instrucional.
No Brasil temos políticas de inclusão equivocadas. Então oferecemos direitos para analfabetos funcionais como exercer cargos legislativos ou votar, em vez de oferecermos direitos mediante cumprimento de deveres. Ou seja, eu posso votar ou me candidatar a um cargo legislativo se demonstrar que não sou analfabeto funcional. Eu mesmo não tenho o domínio preciso da língua portuguesa e de antemão peço desculpas por eventuais erros. Espero que estas falhas não prejudiquem o que desejo comunicar. Mas aliviar o critério de instrução para facilitar a inclusão na cidadania é nefasto e mais, é excludente, por que as consequências práticas de tais descritérios são de atraso e valorização da ignorância, preservando a incompetência que gera exclusão.
Resumindo, aqui, ao tratarmos do vigésimo sexto artigo da DUDH, não podemos mais nos referir a direito de instrução, mas "Direito de Aprender". Às pessoas devem ser concedidos os meios e estímulos para o aprendizado. Sendo o dever do cidadão, em contrapartida, lutar contra a sua própria ignorância. Na sua infância, esta orientação fica a cargo e responsabilidade dos pais. Ao assumir a responsabilidade civil, que entendo deva ser estabelecida a partir dos 12 anos, a responsabilidade passa a ser do próprio indivíduo, quando o ser humano reconhece valores morais, de conduta ética e de importância do estudo para sua vida, mantendo-se os estímulos e orientações familiares e sociais.
Por que essa distinção? Por que a um ser humano o aprendizado deve ser disponibilizado e facilitado. E as escolas e universidades já não representam os únicos meios de prover este aprendizado. Formalizar e obrigar a aprovação escolar já é algo extemporâneo. 
Qual é a chave para o novo modelo de aprendizado a ser proposto? Já afirmei que tudo que a humanidade precisa pra ser feliz já foi inventado. Basta permitir que se usufrua disto. Bem, a experiência do exame da OAB - Ordem dos Advogados do Brasil é a chave. Para que uma profissão formalmente estabelecida seja exercida por alguém, o conselho regulador desta profissão deve assegurar quem pode ou não exercer tal profissão. Como no Brasil os cursos de direito se propagaram de tal maneira que a OAB passou a questionar a qualidade dos profissionais egressos. Portanto somente quem passa num exame feito pela OAB pode ser "Advogado". Simples assim, mas é um baita exemplo de bom senso. A responsabilidade (o dever) de dizer que alguém é um profissional que pode exercer tal profissão é do conselho desta profissão. O exame é absolutamente justo. 
Então quais as consequencias deste modelo? É que todas as provas feitas ao longo da vida pelo pretenso advogado, seja no ensino fundamental, médio ou superior não tem validade nenhuma para o exercício da profissão de advogado. A única prova que assegura o direito de exercer a profissão é o exame da OAB. Então basta essa. Então não há necessidade nenhuma de provas anteriores. Então não há obrigatoriedade nenhuma de demonstrar que foi aprovado no ensino fundamental, médio, superior ou qualquer outro. Portanto não faz diferença o modo como foi aprendida a profissão. Importa que o conselho profissional afirme, segundo seus critérios, que alguém está apto a exercer uma profissão.
Entendeu? Importa o aprendizado e não a escola e o professor. Importa o resultado e não o método, por que o jeito que eu aprendo não é igual ao seu jeito de aprender. Importa que o aprendiz aprendeu e não em qual banco sentou. Importa o que realmente importa. Importa o que realmente funciona -  a competência.
Hoje, somente tem sucesso instrucional quem tem facilidade de aprender pelo método institucionalizado e aceito que é o escolar. E isto é humanamente injusto e desigual.
Então eu sou contra as escolas? Não, jamais. Sou contrário a afirmar que alguem aprendeu algo por que passou pela escola. Sou a favor de dizer que alguém aprendeu algo quando demonstra este aprendizado.
Ou ninguém nunca leu "as pérolas do ENEM"? Temos no Brasil pessoas formadas em faculdades que não conseguem escrever um parágrafo de um e-mail sem erro grotesco.
Se os cursos pré-vestibulares são mais eficazes em preparar as pessoas para ingresso em universidades, por que somos obrigados a fazer o ensino médio? Na verdade, os pré-vestibulares existem pela incompetência em ensinar das escolas, onde se gastam fortunas com resultados pífios.
Acredito que a maturidade estrutural física e emocional do ser humano também deva ser considerada para o exercício pleno de uma profissão ou conclusão de uma etapa instrucional. 
Então para o avanço instrucional de alguém temos que considerar os seguintes fatores:
  • Desenvolvimento físico
  • Desenvolvimento emocional
  • Desenvolvimento cognitivo
  • Desenvolvimento de habilidade na técnica necessária
 Enfim, ficamos com as seguintes condições:
  1. O sistema de aprendizado de um país deveria estimular as pessoas a lutar contra a ignorância em todas as suas formas. As escolas e universidades seriam uma forma de aprendizado, assim com a internet, bibliotecas, ensino familiar, qualquer outro meio ou um conjunto destes.
  2. Um ENEM bem feito seria o teste para demonstrar requisitos instrucionais de cidadania (como não ser analfabeto funcional dentre outros requisitos instrucionais como legislação e finanças) e pode ser considerado como condição para partir para ensinos profissionalizantes e universitarios. Os conselhos profissionais seriam os responsáveis pelos critérios de exercício profissional. A aprovação no conselho implicaria na permissão de exercício da profissão.
  3. As universidades poderiam vender somente as disciplinas de interesse do público em vez do curso inteiro. Por que obrigar um aluno assistir aulas de incompetentes se o aprendizado vai ser adquirido na literatura e internet por esforço pessoal ou cursos extra-curriculares. As aulas de professores realmente brilhantes teriam maior valor e os verdadeiros profissionais seriam realmente valorizados (não é isso que busca a classe dos "trabalhadores em educação" - eis a solução - fim das greves no ensino público). O ensino a distância deve ser aprimorado e popularizado.
  4. Todas as escolas, universidades e faculdades devem ser municipais, pois elas ficam sempre em algum endereço num município e devem ter professores e administração privados. Ao Estado compete a concessão de bolsas de estudo, quando necessário. Toda estrutura das secretarias e ministério de educação seriam desnecessárias, o que seria uma economia monstruosa com a destinação de recursos para o efetivo aprendizado e não para sustento de uma estrutura arcaica, ineficiente e inútil.
  5. Os institutos tecnológicos seriam avaliados pela produção tecnológica em termos de patentes e empresas incubadas e o resultado disto para a sociedade.
  6. Não faz sentido ter professores como funcionários. O professor deveria ser profissional liberal. Os melhores seriam contratados pelos melhores. E quando fossem pesquisadores, o contrato seria por projeto.
Acredito que a solução pode ser aprimorada. Mas o que está posto acima é essencial e simples. Simples assim, mas pleno de bom senso.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Padrão de Vida - Saúde e Bem Estar

Chegamos ao vigésimo quinto artigo da DUDH que trata do direito a um padrão de vida. Veja o texto que contém dois tópicos:

"1. Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle.   
2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social."
O texto não pode ser mais claro. E posso afirmar que no Brasil há lei para garantir tudo isso. Mais que em muitos países desenvolvidos, por exemplo o Sistema Unico de Saúde brasileiro consegue atender gratuitamente milhões de pessoas.
Temos também um sistema de previdência social e seguro desemprego. Com o dinheiro advindo destes benefícios podemos adquirir alimentos, roupas, remédios e condições de habiração. Ainda há programas especiais para mulheres gestantes e para a  infancia.
O Brasil é intencionalmente perfeito na questão de supostamente prover ao brasileiro um excelente padrão de vida em termos de saúde e bem estar. O problema é que não consegue atender a todas as pessoas que necessitam. Ou seja, não funciona para todos. Isto torna o sistema injusto. As pessoas que trabalham para este sistema também não conseguem exercer seu trabalho do modo mais adequado, enfrentando imensas dificuldades. 
Por exemplo, pessoas que são amigas de servidores da saúde ou médicos acabam por alguma razão conseguindo atendimento mais rápido ou benefícios são menos demoradamente concedidos. Será sorte ou privilégio? Não consigo entender este fato pela aleatoriedade, o que me leva a imaginar um esquema velado de privilégios normalmente concedidos pela força de redes de relacionamento humanos e naturais, mas neste caso, injustos e com consequencias desumanas. Você já ouviu alguma expressão do tipo:
  • "Vá lá no hospital X e fale com o Dr. Fulano que é meu amigo, que ele vai te ajudar..."?
  • Ou por exemplo "entra no setor Y e fale com o Cicrano, ele vai te dizer como acelerar este processo..."?
  • Também poderia ser assim: "o Beltrano conhece todo mundo lá dentro, se tu fizeres um esquema com ele, te garanto que vais conseguir a aprovação..."?
  • Ou pior: "fale com o (vereador, deputado, senador)  Gelfrano que ele te facilita..."
Eu ja ouvi expressões deste tipo e você? Podemos partir do princípio que tais benefícios velados existem como forma alternativa ao processo formalmente estabelecido por que simplesmente o que deveria ser normal não funciona. Fato. Simples assim.
Infelizmente estamos muito longe de uma solução nestes aspectos. Mas a solução existe, porém a sua proposição e realização dependem de uma reestruturação do modelo político e econômico sob uma nova ordem baseada no bom senso e na admissão de que algumas funções públicas são completamente desnecessárias assim como alguns modelos de nossa economia devam ser profundamente revisados.
Mas vamos continuar a refletir sobre a nossa situação atual para podermos concluir juntos e apontar algumas soluções.
Vamos  pensar em bases factuais, por exemplo, utilizando o sistema de saúde no Brasil. Temos dois. O público e o privado. O sistema público não consegue atender a todos que precisam no momento que precisam com a condição técnica e humana que é necessária, ainda que seja melhor que muitos outros países. O fato é que não funciona. O sistema privado faz de tudo para que você fique pagando sem usar e quando precisar usar eles vão fazer de tudo para justificar que o médico está errado e que você não precisa do atendimento ou que seu plano não oferece cobertura para o que sua saúde precisa. Eu já tive um plano em que eu tinha que pagar um adicional por ginecologia. Como o plano era familiar e minha esposa e filha podiam ficar grávidas, todos, inclusive eu, tinhamos que pagar este adicional. O fato é, que o sistema privado também não funciona, principalmente quando você alcança a idade em que mais precisa de atendimento. Ao alcançar a terceira idade os valores dos planos são ajustados para que você não tenha condições de arcar e desista do plano. Neste ponto o sistema privado se torna mais que incompetente, desumano. Este seria um assunto de polícia se tivessemos a aplicação de uma simples lei de proteção ao consumidor. A lei nós temos embora mal escrita e cheia de espaços para interpretações. O que não temos é um aparato de justiça e de segurança para garantir, em tempo hábil, rápido e eficaz em ajustar a humanidade de tais sistemas. Mais uma vez penso no quarto poder. Mas seria uma solução reativa. Há outras possibilidades.
Não faz sentido algum termos dois sistemas de saúde. Se temos condições de manter um sistema privado, por que precisariamos de gastos públicos nesta área. Mas se o sistema privado não consegue atender todas as pessoas, então precisamos de um sistema público? E já que é público e gratuito então pode ser ruim? E para que não passe em branco, o sistema de saúde público não é gratuito, pois é financiado pelos impostos que todos pagamos. E não faz sentido algum aceitar algo ruim por que é público. Isso é desumano.
Então, que fique absolutamente claro: qualquer sistema público deve existir onde não haja interesse privado a fim de garantir a humanidade necessária de cada cidadão. O que não pode é existir meio interesse. Se é pra ser privado que seja para atender todas as pessoas em qualquer idade e pelo mesmo valor de serviço. Na discussão do vigésimo quarto artigo da DUDH chegamos a conclusão que um trabalho igual tem um mesmo valor. Então o serviço de saúde deve ter o mesmo valor para um ser humano, seja este de zero a 200 anos de idade, em qualquer rincão do país. E este serviço deve atender a qualquer necessidade, desde o procedimento mais simples até o mais complexo na condição tecnicamente necessária, dentro do estado da arte da ciência médica. Porém, se para essa condição o serviço privado não consegue ser lucrativo, então não deve ser privado. Simples assim. Pois que seja público e muito bem remunerado.
Assim concluímos que segurança e saúde deveriam receber a grande maioria dos valores oriundo dos impostos. Entendo que mais de 50% da arrecadação deveria ser destinada para estes dois fatores essenciais a manutenção da humanidade dos cidadãos.
O fato é que não pode ser ruim. Nos acostumamos a pensar que serviços públicos são gratuitos e portanto podem ser mal conduzidos, executados por servidores mal-educados e mal pagos, em condições de higiene e conservação precárias, etc . Não são e nunca foram gratuitos. Só não podem ser ruins. O que importa aqui é o modelo mental.
Um exemplo típico era a forma como o povo era tratado nos estádios de futebol. Não havia lugares numerados. Os melhores locais para visualização do espetáculo eram ocupados por quem chegasse primeiro. Quem sentava em cadeiras (como um ser humano digno) pagava um valor - o mais caro. Quem sentava sobre o concreto pagava um valor intermediário. E quem ficasse em pé pagava o valor mais barato. Ou seja, o valor do ingresso não estava relacionado com a qualidade de visualização do espetáculo, mas com o nível de sofrimento do espectador na acomodação escolhida. O modelo mental aqui é que quanto mais pobre mais tem que sofrer. E as pessoas acabam se acostumando com isso. Os novos estádios em preparação para a Copa do Mundo de Futebol de 2014 parecem estar mudando este modelo mental, com foco na qualidade do espetáculo e no conforto de quem paga para assistir.
Em outras áreas percebe-se o mesmo modelo. É notória a queda de qualidade da programação em televisão com sinal aberto. Os melhores e mais recentes filmes, documentários e seriados aparecem primeiro nas versões por assinatura e muito posteriormente, em alguns casos, na versão aberta. Programações dominicais são recheadas de programas de auditórios ou diversos formatos absolutamente sem conteúdo e repletos de merchandising. Inclusive as pessoas comentam a excelente qualidade dos comerciais atuais, pois são muitas vezes melhores em qualidade e conteúdo que os programas em si que são patrocinados. E transmissões ao vivo de eventos esportivos e artísticos são cada vez mais raras para favorecer o pay-per-view. Ou seja, o "gratuito" deve ser ruim. O pago deve ser bom. É um modelo introjetado na sociedade, não necessariamente verdadeiro. O fato é que um serviço ou produto tem que ser de muito boa qualidade pelo fato de alguém propor-se a fornecê-lo. Simples assim.
Outro exemplo é o transporte coletivo. Se eu ando no meu carro sem um cinto de segurança, estou cometendo uma infração sujeita a multa por eu estar me colocando em risco por minha livre, consciente e espontânea vontade. No entanto podemos colocar centenas de pessoas dentro de um ônibus para trafegar em pé (e que pagam o mesmo que pagou quem está sentado - aqui a situação é mais injusta que no estádio de futebol), sem ar condicionado, sob conta e risco de um terceiro que nem sempre assegura a manutenção correta do veículo e a competência de seus funcionários no trato com pessoas humanas. Mas como é para pessoas trabalhadoras e de baixo poder aquisitivo, então pode ser ruim e pior, inseguro? Claro que não. O transporte coletivo deveria assegurar que todas as pessoas sejam transportadas com a máxima segurança e conforto. E todos os assentos devem assegurar a mesma qualidade de serviço. É simples.
O mesmo modelo parece que se aplica na saúde. Como é feita pra quem não tem condições de pagar um sistema privado, então pode ser ruim e sofrido? E as pessoas acham que é normal aceitar um serviço ruim, só por que é "gratuito". E não é gratuito. Pior, é pago adiantado todo mês e descontado diretamente de sua folha de pagamento. Nós pagamos adiantado por um serviço que não recebemos com qualidade. E não temos uma única estrutura de poder eficaz e rápida (pois quando o assunto é saúde, o tempo é crucial) capaz de nos defender de tamanha injustiça.
Na alimentação, vestuário, serviços sociais, seguro desemprego, previdência social e cuidados sociais a maternidade e infância poderíamos estabelecer raciocínios similares. E se a condição que estabeleceu uma vida humana estiver fora ou dentro de um matrimônio, isto não vai acrescentar ou reduzir qualquer condição e raciocínio aqui estabelecido. Importa a vida humana.
Concluindo, o que deve ser premissa é:
  1. Uma condição necessária a um ser humano e que precise ser assegurada pode ser fornecida por um de dois meios: público ou privado, mas nunca público e privado. O velho Waldemar sempre dizia que "cachorro com dois donos morre de fome".
  2. Em qualquer caso, deve ser fornecido o benefício no estado da arte tecnológico e processual, sem demora indevida e assegurados todos os requisitos de qualidade do produto ou serviço. Caso tais requisitos não sejam atendidos deve-se punir rápida e exemplarmente os responsáveis (públicos ou privados) a fim de evitar a reocorrência destes comportamentos visto que tem consequências nefastas diretas sobre a dignidade humana.
  3. Os valores tributários (no caso público) ou preços (praticados pelo mercado privado) devem ser estabelecidos em função do produto ou serviço intencionalmente oferecido, não podendo haver distinção de valores em função de sexo, idade, situação pre-existente, probabilidade de ocorrência de algum evento ou acts of god.
  4. No caso de que tais serviços e produtos, necessários à saúde e dignidade humanas, sejam providos através de organizações privadas, a remuneração mínima a ser percebida por cada trabalhador deverá incluir a cobertura de tais necesssidades para si e sua familia.
Simples assim, mas pleno de bom senso.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Repouso e Lazer

A Declaração Universal do Direitos Humanos no seu vigésimo quarto artigo explicita que "toda pessoa tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e férias periódicas remuneradas".
Este artigo pode ser uma continuação do anterior quanto ao direito de escolher o trabalho que deve ser executado com um limite razoável de horas. Se temos que trabalhar é natural que tenhamos repouso e lazer e, além disso, um período de férias remuneradas.
Alguém pode determinar o que é "numero razoável de horas de trabalho"? Evidentemente não haverá consenso neste assunto pela luta de interesses opostos. Então para estabelecer o número de horas razoáveis é preciso um olhar de fora do problema, senão a tendência é decidir pela "minha" preferência, o que não é o caso.
Primeiro ponto, e que já foi discutido, é que trabalho não é um direito, mas uma obrigação, um dever. A sociedade humana ainda não descobriu como se manter sem o trabalho de alguém. Temos o direito de escolher dentre os trabalhos necessários. Mas não há como escolher não trabalhar.
Segundo ponto, é que não se pode trabalhar indefinidamente. Há que se ter, em alguma medida razoável, espaço de tempo para descanso e lazer.
Terceiro ponto, é que existem outras necessidades humanas que devem ser supridas além do descanso e do lazer, tais como, educar ética e moralmente os filhos, conviver com a família, dedicar-se a arte, cultura, ciência, inovação, política, religião e outros assuntos de interesse e relevância humanas que fazem parte de outros direitos descritos na DUDH.
Considerando que os três pontos acima devem ser atendidos, é razoável que pessoas ocupem de seu tempo com o trabalho mais de 8h por dia,  mais 2 a 5h para refeiçoes, higiene pessoal e transporte, mais 8h de sono 5 a 6 dias por semana?
Se você respondeu sim, talvez tenha algum problema de matemática ou precise rever se existe algo mais em sua vida além do trabalho. Agora, se a resposta é não, o que compartilho, então há que se refazer integralmente a legislação trabalhista no Brasil e de muitos países.
No Brasil temos organizações sindicais que defendem a redução de carga horária de 44h para 40h semanais. E acham que é uma luta justa e digna de glória. O pior é que tem gente que defende e acredita.
O trabalho de Domenico de Masi é perfeito na argumentação de uma redução radical de carga horária. A minha divergência é em relação a presunção de que o tempo livre será dedicado ao ócio criativo. O fato de uma pessoa ter tempo livre não significa que vai dedicar este tempo para o ócio criativo. Mas neste ponto a responsabilidade pela vida de uma pessoa é da própria pessoa.  Pois que cada um use seu tempo livre até para o dolce far niente. Por isso entendo que em contrapartida há o trabalho obrigatório.
O fato é que o sistema de trabalho de um país deve ser apoiado nas seguintes condições:
1.Carga horária de trabalho obrigatório (a sua escolha) de 4h por dia, 5 dias por semana com 2 períodos de 20 dias consecutivos de férias remuneradas. Assim não há necessidade de licença maternidade ou qualquer outro tipo de licença que possam ser considerados benefícios eleitoreiros e oportunistas, bem como não haverá necessidade de escolas de turno integral.
2.Salários devem ser estabelecidos em bases de valor/hora e pagos proporcionalmente ao número de horas trabalhadas em pagamentos quinzenais. Mesmo assim qualquer afastamento temporário deve ser não remunerado, incluindo greves. Remunera-se o trabalho, nunca a ausência dele. Uma fração do valor hora é depositado para o gozo de férias.
3.O trabalho social (conservação de espaços públicos, limpeza de pichações, consertos de vandalismos, recolhimento de lixo, manutenção de escolas e hospitais, etc.) e funções de aprendizes deve ser disponibilizado para estudantes em todos os níveis a partir do ensino médio ou quando o indivíduo alcançar a idade de 12 anos, junto com a responsabilidade civil.
4.Bom proveito no tempo livre! Inclusive alguém pode sentir-se feliz no trabalho. Então que busque um outro trabalho. A mudança de ambiente e de negócio o fará mais experiente, mais criativo e mais feliz.
5.Um trabalhador é um ser humano. Portanto as obrigações e direitos de um trabalhador devem ser igualitárias. Distinções, legais ou não, entre trabalhadores públicos e privados é uma aberração estúpida, imbecil, fascista, discriminatória, injusta, interesseira, fisiologista e de má índole.
6.Todos são estáveis no seu emprego enquanto assegurados os resultados favoráveis do seu trabalho numa base de competência. O currículo de um trabalhador é referência para disponibilizar um trabalho para alguém. Mas é do resultado do seu trabalho que advém a medida da sua estabilidade, incluindo sua polidez, educação e relacionamento profícuo com seus colegas, clientes e fornecedores.
Se uma das condições acima não for atendida, o sistema de trabalho sempre será injusto e desumano.
Simples assim, mas pleno de bom senso.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Emprego, Trabalho, Remuneração, Dignidade e Sindicato

O vigésimo terceiro artigo da DUDH é, sem dúvida, aquele que necessita uma clara discussão interpretativa. Embora o texto pareça claro, é na intenção do que foi escrito que reside a obrigação em contrapartida ao direito. Além disso, fatores de ordem comportamental humana devem ser considerados para empreender praticamente o exercício pleno destes direitos na magnitude justa. Caso contrário, o direito é lido de acordo com o que vai ao encontro dos anseios particulares do leitor antes de servir a humanidade. O artigo XXIII possui quatro partes:

  1. "Toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego.  
  2. Toda pessoa, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. 
  3. Toda pessoa que trabalhe tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social.
  4. Toda pessoa tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para proteção de seus interesses".
Então, vamos por partes. O primeiro tópico trata de que toda pessoa tem direito ao trabalho.  Também tem direito a livre escolha do emprego, o que pode parecer contrário a nossa posição de serviço público obrigatório, mas de fato não é. Trata, também, da obviedade de condição justa e favorável de trabalho, mas que haja proteção contra o desemprego. 
Se formos ler de uma forma pouco reflexiva, eu tenho que ter um lugar pra trabalhar, mas que seja escolhido por mim. E o Estado deve prover um meio pra que eu não fique desempregado. É isso? É esse o meu direito humano? Então está feito. Mas há como ficar pior. Se o trabalho é um direito explícito, posso inferir que não trabalhar também seja um direito.  E a proteção contra o desemprego? Ora, que me sustentem enquanto exerço meu direito de não trabalhar. Afinal, o trabalho tem que ser uma "livre escolha", então, enquanto nenhum trabalho me agradar a ponto de escolhê-lo, o Estado deveria prover meu sustento em condições dignas e humanas, correto?
Se você concorda com o parágrafo acima, acredito que a sociedade pode parar de trabalhar nesse exato momento, pois temos que admitir essa possibilidade. Logo, teremos que arrumar um meio de nos sustentarmos sem trabalho. Possivel? Evidentemente que não. Então o trabalho não é um direito, mas um dever! Simples assim. A partir disso, podemos discutir direitos.
Não se pode discutir um direito a partir de um direito. Mas os direitos dentro dos deveres a serem cumpridos (veja o XXIX artigo da DUDH). Os seres humanos para viverem necessitam de um conjunto de produtos e serviços para tornar a sua vida digna, segura e feliz sem que interfiram na dignidade, segurança e felicidade de outrém. Estes bens ou serviços advém do trabalho humano.
Agora podemos discutir a liberdade de escolha do trabalho que é necessário. Dentre os trabalhos necessários, tenho o direito de escolher algum. Uma vez escolhido um, advém mais um dever coerente com o direito de escolha. O trabalho deve prover benefício pelo seu resultado desejado, antes de que exerça algum direito pelo exercício deste trabalho. Ou seja, deve ser feito com competência, dedicação e respeito público e humano ao recebedor do bem ou serviço resultante do trabalho ao longo de toda a cadeia processual e logística. Caso contrário, não estará exercendo seu dever e, portanto, perderá o benefício de auferir o direito como cidadão. Portanto, aquele que realizar seu trabalho com competência, dedicação e respeito público terá proteção contra o desemprego. Caso contrário deveria perder este direito por não cumprir seu dever.
Logo, a interpretação correta do primeiro item do vigésimo terceiro artigo da DUDH segundo o bom senso opõe-se terminantemente à estabilidade no emprego, e não o contrário como o senso comum poderia supor. A proteção contra o desemprego, que é muito diferente de estabilidade no emprego, deve se dar pelo resultado da competência, dedicação e respeito público e jamais por uma lei que diferencie benefícios para trabalhadores iguais.
As condições justas e favoráveis de trabalho são, com o perdão do pleonasmo, "condições" para exercer um trabalho. Tais condições estão firmemente vinculadas a preservação da saúde, da segurança e da qualidade de vida do trabalhador. Sem tais condições não pode haver o trabalho. Sem tais condições não pode haver trabalhador. Submeter-se a uma condição desfavorável de trabalho é uma escolha do trabalhador e uma falsa esperteza do empregador. O ser humano tem que aprender a dizer não a estas condições desfavoráveis e o Estado deve ter um aparato de segurança que previna e puna a ilegalidade que submeta seres humanos a condições desumanas de trabalho. Neste ponto permanece a luta constante contra a ignorância e o medo. O cidadão deve escolher trabalhar em condições humanas e denunciar as condições sub ou desumanas. E o Estado deve ser implacável na condenação de tais práticas de empregadores, a fim de estimular uma concorrência equilibrada entre as organizações que fazem a gestão profícua da Responsabilidade Social.
Resumindo, toda pessoa tem o dever de trabalhar em alguma coisa para auferir direitos de trabalhador. O objeto do seu trabalho é uma livre escolha assim como as condições a que será submetido. A proteção contra o desemprego é dada na medida de sua competente realização do trabalho. Simples assim.
O segundo tópico ressalta a condição de igualdade de remuneração para trabalhos iguais. É justo e óbvio. O que não se discute é o valor de um trabalho. Como damos valores diferentes para trabalhos diferentes, há trabalhadores com maior ou menor remuneração.
Somos cientes que vivemos numa sociedade desigual e injusta. CEO's de dierentes empresas realizam o mesmo trabalho e percebem valores diferentes. É humanamente injusto pelo texto da DUDH. Diretores financeiros realizam o mesmo trabalho em várias organizações. Mas nem todos percebem a mesma remuneração. É injusto. Operadores de máquinas, por exemplo de "centros de usinagem", realizam o mesmo trabalho em várias organizações e não recebem salário igual. É injusto. O texto da DUDH é claro que a remuneração deve ser igual para trabalhos iguais. E nestas situações poderíamos até julgar que há possíveis diferenças com alguma tentativa de justificativa para a desigualdade. Mas e o caso de jogadores de futebol. Por exemplo todos os goleiros exercem a mesmíssima função. E todos os clubes pagam a mesma remuneração? Parece que ouvi um leitor pensando, "puxa vida, no esporte, como na arte, a diferença está no talento". Então talentos diferentes justificam remunerações diferentes? Este é o critério? Será que o critério de talento vale em todos os casos, incluindo serviço público e cargos eletivos? Afinal qual é o critério de igualdade de remuneração para igual trabalho? Como definir "igual trabalho"?
"Igual trabalho" implica em comparar trabalhos e chegar a uma conclusão. Mas o critério seria comparar o requisito para uma trabalho? Ou comparar o método de execução do trabalho?  Se algum destes for o critério de comparação do trabalho, o goleiro do Luziânia deve ser remunerado de forma absolutamente  igual ao goleiro da Seleção Brasileira.
Será que o critério é comparar o resultado de um trabalho? Ou o critério é comparar a competência (talento) das pessoas que executam o trabalho? Neste caso não é "trabalho igual" mas equivalência de competência na execução e resultado do trabalho. Assim como vendedores comissionados que ganham mais quando vendem mais. Como a competência e os resultados não são mantidos constantes (e nem dependem isoladamente do trabalhador em si, mas de todo o sistema de negócio), a remuneração seria justa se fosse variável. Qualquer valor fixo seria injusto e desprovido de critério.
Então qual é a solução? Infelizmente, o trabalho é um mercado (ou ninguém nunca ouviu falar de "mercado de trabalho", "profissões do momento", etc.) e como tal os valores dos trabalhos oscilam de acordo com as necessidades da humanidade em termos de profissionais e trabalhadores em geral. Resumo, existe trabalho igual, mas nunca remuneração igual para o mesmo trabalho executado em organizações diferentes por pessoas diferentes em sistema de negócios diferentes. Mas então o texto da DUDH está errado? Não, mas mal escrito. Faltou a palavra "mínimo". Cada trabalho tem um valor que depende do mercado, mas um trabalho nunca poderá perceber menos que um valor mínimo. E este valor está associado com uma condição média de qualidade de vida que inclua - segurança, saúde, transporte, cultura, arte, lazer dentre outros fatores. Ou seja, toda pessoa tem direito à igual remuneração mínima e digna por igual trabalho. Simples assim.
No Brasil fala-se em salário minimo sem qualquer vinculação com um trabalho. Trata-se de um mero indexador e de um sistema de controle previdenciário por parte do Governo. Nada há de mais inútil, injusto e estúpido. E pior, um direito criado na era Vargas, deturpado ao longo de décadas e ainda mantido. Embora controverso, para alguns parlamentares, é valorizado como uma conquista do povo. Não é isto que propomos.
Salário mínimo é, para qualquer mente minimamente provida de algum pedaço de neurônio, o mínimo que uma pessoa pode receber em termos financeiros para satisfazer todas as necessidades a fim de assegurar plena qualidade de vida. Menos que isso não é mínimo, pois seria subexistência e, a um ser humano deve ser dado o direito de existir e usufruir plenamente de tudo que a humanidade construiu para a felicidade, resguardado o cumprimento de todos os deveres de cidadão.
Com isto convergimos ao terceiro ponto deste direito humano. Remuneração justa e satisfatória que garanta uma "existência compatível com a dignidade" para o trabalhador e sua família, e, se necessário que se acrescente "outros meios de proteção social". Lembrem-se do quarto poder, sem o qual nada se garante. Mas agora começamos a depreender o sentido real deste direito e os critérios associados. Simples assim.
E, por final, o quarto tópico trata do direito de associação que já discutimos anteriormente. Aqui, chama a atenção o direito de organizar ou associar-se a um sindicato para a "defesa dos seus interesses". Mais claro impossível. Embora tenha sido expresso no texto de outro direito, estes "interesses" não podem afetar a humanidade de ninguém que se oponha aos "meus interesses". Pois se é justo que eu defenda meus interesses, também é justo que eu respeite a defesa dos interesses dos outros. E se cada um defender seus próprios interesses e a medida da justiça for o interesse individual, a anarquia social estaria instalada na sua pior concepção. É preciso um Estado que defenda o cumprimento de leis que sejam pautadas por princípios humanos. Nenhum interesse pessoal poderia estar acima destes direitos.
Simples assim mas pleno de bom senso.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Segurança Social e Realização Pessoal

O artigo de número XXII da DUDH é claro e lógico: "Toda pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social e à realização, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade".
Este direito é válido para pessoas - seres humanos. Portanto para seres desumanos não vale. Este é maior equívoco que reside em algumas instituições (ONGs, OSCs) de Direitos Humanos que defendem a integridade de estupradores, assassinos, traficantes de drogas, servidores públicos nefastos, políticos corruptos  e outros seres desumanos, ou sejam, praticantes de desumanidades o que lhes desqualificam como cidadãos. E portanto não podem receber direitos de cidadão, pois não o são.
Recentemente tivemos o assassinato de dois jornalistas (vide http://knightcenter.utexas.edu/pt-br/blog/comissao-da-oea-critica-brasil-por-assassinatos-de-jornalistas) e já sabemos quanto tempo vai levar para apurar o dolo. Para que não pareça maldade minha, ou injusto no comentário, alguém apostaria que a solução dos casos e punição aos culpados vai levar menos de 1 ano (tempo mais que suficiente pra resolver este assunto)? Vamos aguardar e depois podem me cobrar caso leve menos de 365 dias, a contar de 11 de maio de 2011-data da publicação da reportagem citada, para que todos os culpados sejam verdadeiramente presos e punidos.
Vejamos alguns dados (http://www.consciencia.net/mundo/desigual.html, acesso em 23 de maio de 2011):

  • "A cada 12 minutos, uma pessoa é assassinada no Brasil. Por ano, são registrados 45 mil homicídios no País. No entanto, a probabilidade de um assassino ser condenado e cumprir pena até o fim no Brasil é de apenas 1%".
  • "O Brasil é, segundo a ONU, o país onde mais se mata com armas de fogo. Todos os anos são mortos 40 mil brasileiros";
  • "1,9% do PIB brasileiro é consumido no tratamento de vítimas da violência";
  • "O Brasil tem cerca de 3% da população mundial e registra 12% dos homicídios que acontecem no planeta."
Se você tem acompanhado meus comentários sobre o que acontece no Brasil e as devidas comparações com a DUDH, já deve ter percebido a construção de alguns critérios relacionados com o Bom Senso. Talvez o critério mais claro que se deva estabelecer é sobre Eficácia.
Somos eficazes na proteção e segurança de nossos cidadãos? Primeiro na proteção e quando falhamos nesta (o que deveria ser raro) temos a garantia de que o culpado será sumária e definitamente punido e a probabilidade de reocorrência reduzida a zero?
Para que se diga que algo acontece, de acordo com o bom senso, é na prática que constatamos a veracidade deste acontecimento. Caso contrário não pode ser uma verdade tácita do ponto de vista da avaliação de quem promete fazer algo. Se dizemos que temos direito à segurança e à realização pessoal, de acordo com o artigo XXII da DUDH, então algumas coisas são perceptíveis na vida de cada cidadão. É facil responder às seguintes questões:
  1. Nenhuma casa de família possui grades ou muros, pois a segurança pública separa e protege os cidadãos dos não-cidadãos?
  2. Todas as escolas possuem salas com ar condicionado, sistemas audiovisuais, computadores e ninguém entra para assassinar crianças ou furtar tais objetos?
  3. Você pode andar pela sua cidade em qualquer horário e em qualquer bairro sem ser importunado por pedintes em sinaleiras ou pessoas estranhas na rua?
  4. Seu carro pode ser estacionado em qualquer local público (onde permitido) durante jogos de futebol, shows musicais ou mesmo próximos a bares e locais de lazer, sem que você tenha o receio de que alguém vai invadí-lo ou furtá-lo?
  5. Ninguém morre por "bala perdida"? 
  6. Os assassinatos no Brasil são inferiores a 40 por ano (quarenta mesmo... não quarenta mil)?
Poderia fazer mais uma centena de questões similares. Mas vamos ficando por estas. Se você respondeu sim. Então o seu direito está assegurado. Mas se você respondeu não, então, na prática não temos nosso direito humano à segurança assegurado.
É triste, mas mais uma vez, afirmo enfaticamente que não temos segurança pública no Brasil. O medo vive no íntimo de cada cidadão que cada vez mais gasta com segurança pessoal, dispositivos de segurança (alarmes, blindagens, câmeras, etc), apólices de seguros, enfim, um conjunto de condições que deveriam estar a cargo do poder público por que deveria ser um Poder a serviço do Público. Simples assim.
Agora mais duas questões. Responda simplesmente "alta", "média" ou baixa".
  1. Com que frequência você vê noticias de alguma OSC/ONG defendendo o direito à segurança publica de um cidadão trabalhador com a reposição imediata de qualquer prejuizo e a punição exemplar de pessoas que ferem a segurança de um cidadão?
  2. Com que frequência você vê notícias de alguma OSC/ONG reclamando de violência excessiva de agentes de segurança ou de maus tratos a delinquentes (desumanos, não-cidadãos)?
Se respondeu alta para a primeira e baixa para a segunda, talvez tenhamos estruturas de segurança razoavelmente justas e OSC/ONGs bem intencionadas. Os desvios indesejáveis seriam fáceis de identificar e corrigir. Se respondeu o contrário (que compartilha da minha experiência) então reafirmamos que estamos distante de um modelo de segurança voltado ao benefício proativo, preventivo e, quando necessário, corretivo à sociedade de cidadãos e que os critérios para estabelecimento de uma OSC/ONG de defesa dos Direitos Humanos deveria ser revisto. Qualquer outra opção é evidência de insegurança de serviços e OSC/ONGs com outras intenções que excedem a defesa dos Direitos Humanos em si, do modo como foram estabelecidos na DUDH.
De fato a nossa realidade é de muita insegurança. E enquanto as políticas e os políticos forem mais relacionados com o poder e a locupletação deste ao invés de preocupar-se de fato e de direito com a vida de cada cidadão, muitos seres humanos sofrerão e muitos não cidadãos ganharão fortunas a custa de morte de algumas míseras quarenta mil pessoas por ano. É só um pouco a mais do que uma guerra civil, não é? Imagine, o Brasil assassina um estádio de futebol praticamente lotado de pessoas por ano, só isso. E nosso povo até acha engraçado quando a caricatura desta realidade aparece em alguns programas humorísticos, não é? Segue a vida do jeito que está e estamos todos felizes. Simples assim.
A solução já discutimos em comentários anteriores: o quarto poder precisa ser estabelecido, os critérios legais tem que privilegiar o cidadão antes do não-cidadão e, na prática, a paz e a ética tem que ser a regra.
Mas o artigo XXII da DUDH tem mais um aspecto a discutir. Além da segurança há o direito de realização. E só é possivel realizar-se onde a segurança nos é garantida. É impossível sentir-se realizado com medo. Assim como é impossível realizar-se sem tempo para arte, cultura, ciência, lazer, convívio profícuo com os entes familiares incuindo educação e formação moral de filhos e compartilhamento de experiência de vida, enfim, para o ócio criativo e não criativo.
Então é preciso revisar profundamente o que entendemos por trabalho ( no sentido de Domenico de Masi de que "é tudo que faz suar e que não é esporte") e quanto tempo devemos dedicar a este. Entendo que temos que nos dedicar ao trabalho necessário e que precisamos contribuir moral e socialmente com a sociedade. Aqui uma certa divergência com o sociólogo italiano citado.
Você quer ser um lixeiro? Você quer que seu filho ou filha sejam lixeiros? Alguém até pode responder que sim pois é um trabalho digno. Mas penso que a grande maioria responderia não. Neste caso, qual a solução? Primeiramente eliminar a função de "lixeiro". E qual a condição para isto? Não gerar lixo, assim a função de lixeiro seria dispensável. Isto é plausível hoje? Penso que não. Então a função de lixeiro é necessária para o bem de todos? Então alguém tem que fazer e ser bem remunerado por isso. Porque não distribuímos esta função para jovens em carater obrigatório? Assim como outras funções públicas necessárias. Tenho a mais absoluta certeza que desenvolveríamos outro tipo de cidadão no mínimo muito mais consciente do ponto de vista ecológico. No entanto nenhum trabalho deste tipo poderia ser executado em mais de 4 horas diárias. Aliás nenhum trabalho deveria exceder 4 horas para que, quem quizesse, use o tempo livre para produzir arte, ciência ou cultura. Poderia dedicar-se também a obras sociais, atuação em associações, ONGs ou política partidária. Também, alternativamente, poderia dedicar-se a outro trabalho ou ao dolce far niente. Não importa "o que" faz. Mas "como" faz. Se sentir-se seguro e realizado, então é humano. Caso contrário é desumano e é preciso mudar. Simples assim, mas pleno de bom senso.