quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Igualdade e Liberdade

A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (para grifar bem que faz muito tempo que a humanidade concebeu estes pricípios) em seu artigo primeiro relata que "todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade."
Já observamos que até legislações são construídas para dar amparo legal a desigualdade, auferindo direitos distintos para pessoas semelhantes. Popularmente há o ditado de que "somos todos iguais, porém alguns são mais iguais do que os outros". Não há expressão mais perfeita para representar a nossa realidade. Por exemplo, o que acontece quando entramos num banco e precisamos crédito, quando elaboramos um plano de negócio e o conjunto de garantias que nos são exigidos para obter apoio ao investimento ou outras situações do gênero. É de conhecimento público que em muitos casos um sobrenome facilita muitas negociações, mesmo diante de projetos incompetentes, relaxando as avaliações de risco e a necessidade de garantias. Que o relacionamento pessoal com agentes de financiamento, organizações para licenciamento ambiental ou sanitário, ou outras entidades de caráter público e até privado ajuda no andamento de processos. Ou no hospital público, o amigo do médico fica aguardando na fila do mesmo jeito que os demais? O trabalhador comum, verdadeiro acionista da máquina pública, pode definir seu salário e benefícios tal como os parlamentares brasileiros?
Na prática somos iguais? Na vida real somos iguais? Não podemos negar o fato: Não somos iguais na vida que vivemos e da forma como a sociedade humana está estruturada. Somente seremos verdadeiramente iguais se cada ser humano puder escolher como ser feliz e efetivamente realizar esta felicidade sem macular a respectiva felicidade do outro e, principalmente, quando formos capazes de nos alegrar sinceramente com a felicidade dos outros ao invés de cínica e sadicamente atuarmos imbuídos de inveja sobre outrem.
E será que somos verdadeiramente livres? O que é ser livre?
Segundo a Wikipédia "liberdade, em filosofia, designa de uma maneira negativa, a ausência de submissão, de servidão e de determinação, isto é, ela qualifica a independência do ser humano. De maneira positiva, liberdade é a autonomia e a espontaneidade de um sujeito racional. Isto é, ela qualifica e constitui a condição dos comportamentos humanos voluntários."
A liberdade está associada portanto a potencialidade de ser independente, mas relativizada pela liberdade dos outros seres humanos. Vamos aos exemplos.
Quando nascemos somos livres? Evidentemente talvez seja nosso período de menor liberdade e de maior dependência dada a fragilidade física de nossa condição infantil.
Podemos escolher se devemos ou não trabalhar? Depende da origem e fonte de nosso fluxo de caixa. Para os assalariados há possibilidade de escolher? Suícídio é uma opção?
Por que muitos de nós saem de suas casas todos dias pela manhã para poder pagar energia, água, impostos, TV por assinatura, internet, combustível, prestação de carro, taxas escolares e auferir alguns dias de férias? Fazemos isso tudo de forma totalmente livre e espontânea? Pago impostos de forma livre ou isto nos é imposto (desculpe o trocadilho)?
Para os seres humanos que sofrem com a fome na África, no Haiti ou em qualquer país onde haja pobreza, isto é resultado de uma atitude livre?
Robert Toru Kiyosaki (autor do best seller "Pai Rico, Pai Pobre") em um de seus livros afirma que a riqueza está associada a liberdade. Um assalariado médio pode comprar um carro popular mas talvez não possa comprar uma Ferrari, um Porsche ou outro carro de maior valor de mercado. O rico, se quiser um carro popular ele compra, se quiser um de maior valor, também, logo é mais livre segundo este autor.
Por convicção, não somos livres para a ilegalidade no estado democrático e de direito. Não é possível ser livre para destruir, matar, poluir, enganar, ludibriar, pichar, roubar, estuprar ou qualquer outra situação que não deve ser uma opção, apesar de muitas vezes possível.
No entanto até para a ilegalidade há pessoas mais falsamente livres do que outras. E também esta falsa liberdade está associada ao poder econômico. O dito popular afirma que "é muito difícil um rico ir parar na cadeia". A realidade parece confirmar este dito, principalmente quando o agente da ilegalidade está amparado por imunidades parlamentares, decursos de prazos ou ausência de provas.
Um simples exemplo é a multa. O que é uma multa? Teoricamente é a penalidade financeira estabelecida para uma ilegalidade. Para mim, multa é o direito de pagar para ser ilegal e uma forma do governo (municipal, estadual ou federal) aumentar suas receitas, que se torna conivente com a ilegalidade dada a conveniência. Se eu ultrapassar o limite de velocidade com meu carro em uma rodovia eu posso ser multado e, digamos, que o seja. Ao pagar a multa, fico em dia com a sociedade. Então, se eu quiser ser ilegal e a ilegalidade tiver preço (multa) e eu estiver disposto a pagar, a lei permite que eu seja ilegal legalmente.
Por que a multa por ultrapassar o limite de 80 km/h da maioria de nossas rodovias não é, por exemplo, 5 milhões de reais ou 2,5 milhões de dólares? Afinal não é a vida das pessoas que está em jogo? Afirmo, então, que a vida das pessoas pode ser colocada em risco por valores bem menores no Brasil. Ou afirmo que o objetivo da multa de trânsito é, na sua maioria, arrecadadora portanto. E afirmo por ser lógico, sem discutir a intencionalidade. É o sistema que está montado de forma errada e pautado por princípios errôneos. Caso contrário teríamos meios tecnológicos de limitar velocidades nos veículos de fábrica. Já pensou comprar uma Ferrari que não possa ultrapassar o limite de, por exemplo, 100 km/h?
Quem sabe, poderíamos estabelecer uma escala de liberdade que começa do zero e vai até, por exemplo, 100 por cento. Pense comigo qual o nível de sua liberdade neste momento? Acredito que poucos dirão zero e, com certeza, ninguém ousará dizer 100.
Para concluir, ninguém é totalmente livre. Isto é um fato real. Então por que lutamos por liberdade? E que tipo de liberdade?
Luto pela única liberdade plena que temos. A liberdade interna de pensamento e de expressarmos este pensamento. Talvez esta seja a principal razão da existência deste Blog. O único exercício pleno de liberdade possível e real.
A liberdade de expressão, passa pela liberdade de imprensa, mas é bem maior que isso. Ou você acha que boa parte da imprensa não ameniza informações negativas de seus patrocinadores ou sobrevaloriza as positivas? E o pior da imprensa é quando ela se diz imparcial. Não existe imparcialidade onde há legítimo interesse.
Mesmo que o leitor não concorde com nada que tenha escrito, luto para que qualquer um possa expressar esta discordância.
Acredito que seremos mais iguais quando tivermos a mesma oportunidade de expressarmos nossos pensamentos e realizarmos o que nos faz feliz. A internet parece ser uma ferramenta bastante apropriada para apoiar este processo.
Enfim, o pensamento não muda nada. Não precisamos temê-lo. O que faz a diferença no mundo é a vontade de tornar o pensamento real. Quando pensamos unidos e munidos de vontade, fazemos a nova realidade para todos. E podemos errar ou acertar. O futuro virá, resta saber qual a nossa participação nele. Simples assim, mas pleno de bom senso. 

P.S. Veja a obra de Tonho Crocco, músico processado por expressar sua opinião na sua arte. Vale lembrar que alguns nomes citados na obra supostamente reclamaram da censura da ditadura militar... e "quem não vive como pensa acaba pensando como vive":

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